Indiana Jones e a Relíquia do Destino | Crítica

Pedro Antonio
3 min readJul 13, 2024

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Harrison Ford em sua caracterização icônica como o personagem em "Indiana Jones e a Relíquia do Destino" (Foto: Disney/Lucasfilm/Reprodução)

Ao final da sessão de Indiana Jones e a Relíquia do Destino, quinta e derradeira aventura do arqueólogo, uma fala ressoava comigo, talvez mais do que deveria. No clímax, quando a nova personagem Helena, interpretada por Phoebe Waller-Bridge, está enfrentando vilões a caminho de salvar Jones, seu padrinho, ela derruba um do avião e diz: “Desculpa, mas você é nazista.” Naquele momento, é possível entender o que a franquia havia se tornado ali, ela agora pede desculpas por ser o que é, fazer o que faz.

O personagem Indiana Jones surgiu há mais de 40 anos inspirado nos heróis pulp da infância do seu criador George Lucas. Com Steven Spielberg na direção e Harrison Ford como protagonista, estava formada a trinca responsável por aquele que se tornaria um verdadeiro ícone para a cultura popular, sendo o maestro John Willliams uma espécie de quarto mosqueteiro. Em 1981, chegava aos cinemas Os Caçadores da Arca Perdida, seguido por dois outros longas ao longo da década e um quarto filme em 2008.

Na época em que se passavam as primeiras estórias, a década de 1930, os principais inimigos eram os nazistas em sua busca pelo oculto, e eram combatidos com fervor pelo arqueólogo. Sendo os vilões representantes do mal indefensáveis, Spielberg, ele próprio um judeu, estabelecia um pacto com o público. Aquelas figuras não teriam qualquer tipo de conflito ou questões mais profundas, eles apenas precisam ser detidos e vale tudo para tal. É tão preto no branco quanto qualquer conto simples de mocinho e vilão.

Cena de introdução do arqueólogo em "Os Caçadores da Arca Perdida" (Foto: Lucasfilm/Divulgação)

Parece que para 2023, no entanto, tais conceitos não são mais suficientes, ao menos é esse o tipo de pensamento que guia os realizadores de Relíquia do Destino. Agora, a aventura é comandada por James Mangold, depois de Spielberg deixar o projeto em meio a inúmeras reescritas do roteiro, que passou por oito mãos, sendo nenhuma delas as de George Lucas. Voltam aqui Ford vestindo o chapéu e John Williams compondo a trilha sonora. Nem todas as peças do que fizeram da franquia o que ela é estão presentes e isso é sentido do início ao fim, na falta do charme de Steven ou da leveza que as falas de Jones tinham no texto de George.

Na aventura ambientada em 1969, a principal ameaça da franquia segue viva, aqui adormecidos e escondidos em solo estadunidense após a derrota da Alemanha em 1945. Porém, o longa se preocupa em deixar bem explicado toda a obsessão do vilão pelo artefato, inclusive através de um estendido prólogo que reforça que aquilo tudo é pessoal. Mads Mikkelsen, interpretando aqui provavelmente o centésimo vilão da sua carreira, quer não apenas o poder, mas reescrever a história com ele no topo. A ideologia fica em segundo plano para dar lugar à megalomania do indivíduo, que é, portanto, humanizado.

Não apenas a simplicidade ficou para trás, mas também o vigor. É compreensível que Ford, aos 80 anos, não tenha mais o mesmo ânimo para encarar cenas de ação como nos anos 1980, mas em vez de se adaptar às condições de seu protagonista, o roteiro continua investindo em perseguições e embates físicos, fazendo uso de trucagens para criar a ilusão que o ator ainda está pulando de um carro a outro, correndo, trocando tiros. Tudo é lento e artificial, o que prejudica o envolvimento. Sendo a exceção uma cena subaquática, que apresenta o personagem num cenário pouco explorado anteriormente e é um raro momento em que se sente que há algo em risco.

O pior erro de Relíquia do Destino, porém, é não compreender que mais do que um herói, Indiana Jones é um símbolo do cinema de aventura. Se essa é realmente sua última aventura, é triste que ele acabe assim, sem as mentes que o idealizaram no comando e sem o que fez se tornar tão especial no imaginário coletivo. Itens como o chapéu e o chicote são bem mais que acessórios, são ícones, representam além de uma figura emblemática, um tema musical marcante, diversão, empolgação e representam dar soco em nazistas, sem se desculpar por isso.

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Pedro Antonio

Apaixonado por filmes, viciado em livros, consumidor voraz de batata frita. Jornalista, professor e sonhador nas horas vagas